Andar foi o primeiro exercício da espécie humana, e por meio dele podemos desenvolver mindfulness de uma maneira profunda e frutificante. O andar meditativo nos possibilita treinar duas habilidades muito importantes para nosso funcionamento diário saudável.
Desejando treinar a concentração podemos focar mais atentamente nas sensações de nossas pernas e pés à medida que se movimentam, tocam no solo, sofrem diversos tipos de pressão dependendo do terreno em que andamos e de sua inclinação. Não só treinamos nossa capacidade de nos concentrarmos, mas também entramos em contato com o corpo em movimento, nos habituamos a nos voltar para ele como forma de contemplação. Nesse tipo de treinamento é importante desenvolvermos curiosidade em relação ao que fazemos. As diferenças entre uma perna e outra, a temperatura ou a textura em que pisamos, o esforço necessário em cada passo.
Podemos fazer a prática andando de duas maneiras, uma mais formal (que usa um ambiente mais restrito e por um tempo limitado) e uma informal, quando a fazemos, por exemplo, num parque ou numa rua mas tranquila. Em ambas podemos igualmente escolher exercitar um foco mais aberto, alargando a consciência para todo o espaço em que o andar acontece. O foco aberto na meditação andando, principalmente quando feito em um ambiente natural, pode ser uma maneira maravilhosa para entrar em contato com a beleza que vem da natureza e a transcendência em relação à nossa perspectiva autocentrada e autoreferente.
Em parques e ambientes mais campestres ande naturalmente, aberto a todas as coisas, as formas das árvores, as pequenas plantas e insetos, a amplidão do céu ou do mar, os sons ao redor, o cheiro das coisas. Não se deixe capturar por nenhum detalhe, não se apegue a algo em particular, mantenha o foco aberto, equânime, leve.
Você logo perceberá que todos os sentidos são ativados quando você escolhe trazer mindfulness para o andar. Note como sons, cheiros e sensações diferentes são percebidos quando aplicamos uma atenção calma e receptiva. Combine a caminhada com a respiração, deixe que movimento do corpo, entrada e saída do ar, e o ambiente em torno se mesclem em uma só experiência. Ao mesmo tempo que a atenção focada nos permitir distinguir a individualidade das experiências sensoriais, a consciência aberta nos aponta para a intrínseca interdependência de todas as coisas. Nesse entendimento experiencial da interdependência poderemos perceber como um enfoque menos autoreferente, nos abre para as experiências do maravilhamento, da unidade, da calma de corpo e mente.
O andar contemplativo tem sido praticado desde tempo imemoriais. Ele implica em andar mantendo uma mente aberta e profundamente receptiva. E se você escolher o ambiente natural para praticá-lo, poderá talvez ter uma experiência semelhante a esta que o poeta transcendentalista americano Ralph Waldo Emerson descreveu: “Nas florestas, retornamos à razão e à fé. Lá sinto que nada pode me perturbar na vida – nenhuma desgraça, nenhuma calamidade, que a natureza não possa reparar. De pé no puro solo – minha cabeça banhada pelo ar alegre e elevada ao espaço infinito – todo egoísmo vão se esvai. Torno-me um globo ocular; sou nada; vejo tudo; os correntes do ser universal circulam por mim; sou parte ou parcela de deus. O nome do amigo mais próximo soa agora estrangeiro e acidental; ser irmão, conhecido, mestre ou servo, é tudo pequeno e uma perturbação. Sou o amante da beleza incontida e imortal”.