Crescer a prática como uma árvore

Impaciência é um problema comum que aflige nossa sociedade. Queremos tudo ‘para ontem’. Infelizmente, este reflexo da vida moderna de consumo rápido e oferta quase infinita de produtos e experiências, acaba se refletindo em nossa prática de mindfulness. Participamos de um fim de semana de meditação, ou mesmo as oito semanas de um programa de mindfulness, e esperamos por resultados imediatos. Para quem se aplica e está atento, alguns resultados realmente aparecem em tais períodos curtos, e podem ser motivo de alegria para o iniciante. Com a passagem do tempo, porém, alguns podem pensar que os efeitos de suas experiências com mindfulness vão perdurar sem que haja uma continuidade nos exercícios. E, claro, isso não ocorre, decorrendo daí frustração e desistência das práticas que inicialmente tanto ajudaram a pessoa a descobrir um novo modo mais consciente de viver sua vida.

Um símile que podemos oferecer para a prática é compará-la ao crescimento de uma grande árvore. Queremos que nossa experiência do viver consciente seja como uma frondosa árvore, não como uma plantinha que cresce rápido e logo perece. Para que a árvore cresça forte e saudável é preciso criar as condições necessárias. É dito que a chuva é como a calma que precisamos desenvolver. Diariamente um pouco de água, na medida certa, evitando que a planta resseque. É importante a prática diária de algum dos exercícios de mindfulness e que isso seja feito sem ansiedade, sem pressa. A calma paciente garantirá a umidade.

Santikaro, um experiente professor americano de meditação, diz que não é parte do trabalho de mindfulness criar a felicidade ou o estado desperto em nós, mas preparar as condições mentais para tal. Ele diz: “Estamos ocupados demais observando a TV, comendo, preocupando-nos com o futebol ou qualquer outra coisa que fazemos para nos manter ocupados. Para esta prática precisamos prestar atenção. Ninguém nos salvará. Ninguém nos fará felizes ou tristes. Se prestarmos atenção à vida, tais coisas irão ocorrer naturalmente. Tudo aquilo que precisamos pode ser encontrado no mundo natural, nestes corpos e mentes, se aprendermos como prestar atenção. E esse que é o trabalho de mindfulness”.

Em seguida temos o sol, que neste símile é como as sucessivas compreensões que vamos tendo a respeito tanto de nossa vida pessoal quanto da vida em si. A manutenção da prática e seu aprofundamento garante que a visão do praticante sempre se mantenha em crescimento e sua motivação constante. Como o sol ilumina o mundo, a compreensão e o insight tornam mais e mais claros os aspectos da vida que precisam ser iluminados. Como diz Sócrates: “A educação é o cuidar de uma chama, não o preenchimento de um vaso”. Se você não mantiver uma mente sempre curiosa e interessada, a chama apagará.

E não podemos esquecer a função do solo cuja fertilidade será a base para o crescimento da árvore. O solo aqui é a fé do indivíduo de que seu esforço terá fruto. Novamente, Santikaro tem algo a dizer sobre isso: “As pessoas vêm para retiros de meditação e querem que as coisas aconteçam rapidamente. Olham para os seus relógios e pensam: ‘Ah! só tenho dois dias’. Então, claro que nada acontece ou o que acontece são frustrações e sofrimentos”. Rick Hanson, psicólogo e neurocientista, diz que uma pessoa que tem muita responsabilidade sobre outra, também tem maior responsabilidade. Por exemplo, um cirurgião tem grande responsabilidade em relação ao paciente que jaz à sua frente na sala de operação. E quem é a pessoa que tem a maior responsabilidade sobre nós? Nós mesmos! Somos os responsáveis por quem nos tornaremos minuto a minuto. Devemos assumir a responsabilidade sobre nós mesmos, ter fé que nossa determinação e esforço na prática causará frutos significativos no futuro próximo. A fé aqui não é numa promessa impalpável, mas vem de uma percepção dos frutos que já estamos percebendo nos primeiros passos da prática do viver consciente, fé de que nossa perseverança trará mais e mais amplidão para nossa visão da vida. À medida que somos diligentes nas práticas de mindfulness tornamo-nos conscientes das experiências benéficas que surgem em nossas vidas, e notamos como até mesmo isso influencia aqueles ao nosso redor.

Guardem as palavras de Malcolm Gladwell: “Prática não é aquilo que você faz quando você está bem. É aquilo que você faz para estar bem”.

* Ricardo Sasaki é psicólogo clínico e um dos professores do NUMI.

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