É natural que algumas pessoas pensem que a meditação ou as práticas de mindfulness possam levar a uma passividade em relação à vida, afinal elas frequentemente são definidas como uma observação do momento presente, sem julgamento, com atitude aberta e receptiva. Isso muito facilmente pode sugerir que aquilo preconizado é uma atitude passiva. Longe disso, no entanto, mindfulness implica uma posição primariamente ativa de todo o sistema mental. É preciso estar alerta, consciente do que está ocorrendo no momento presente, respondendo, então, de acordo, ou seja, apropriadamente segundo a situação. É esta segunda parte, a resposta hábil diante da situação presente, que frequentemente é esquecida pela crítica de passividade.
A prática de mindfulness nasceu de um confrontamento com o problema do sofrimento. Diante do sofrimento em si e no mundo, o que podemos fazer? Resignamo-nos diante do sofrimento, considerando-o como desígnio divino, castigo kármico ou casualidade inevitável? Ou reconhecemos que pelo menos uma parte significativa do sofrimento é causado por nós mesmos, diretamente ou como consequência de nossas reações? De fato, o modo como reagimos àquilo que nos ocorre tem um efeito imediato sobre como sentimos tal experiência. E quanto mais reagimos de maneiras negativas, aversivas e ressentidas, maior o sofrimento que é experienciado. Na verdade, não só nossas reações, mas até mesmo como nós concebemos e interpretamos aquilo que estamos vivendo, influenciam nossas emoções.
Ao escolhermos nos tornar mais conscientes da vida é inevitável entrar em contato com a realidade de que há muito sofrimento no mundo. Ao percebermos o sofrimento em nós, e compreendermos que temos um papel ativo em sua permanência em nós, isso nos motivará a descobrirmos meios de minorar a influência negativa de nossas próprias ações em nós mesmos. E ao percebermos o sofrimento no mundo lá fora, e compreendermos que nossa ação compassiva e generosa pode ajudar a diminuir um pouco do sofrimento no mundo, isso nos motivará a nos engajarmos em uma ação positiva em relação àqueles que nos cercam.
O professor de mindfulness do Sri Lanka, Godwin Samararatne, ressalta a importância da motivação ao se engajar na meditação: “Gostaria de sugerir que vocês desenvolvessem uma verdadeira motivação para aliviar seu próprio sofrimento e o sofrimento dos outros. E que possam traduzir a compaixão em ação. Por favor, percebam que, com a meditação, a pessoa não se torna inativa, ninguém se torna passivo; em vez disso, estarão agindo, mas a qualidade da ação será diferente”.
Colocamo-nos numa posição de conscientização em relação ao momento presente, sim, mas o movimento consciente não para aí. Ele continua com a sabedoria de perceber se algo precisa ser feito diante de cada situação. Na falta de consciência e sabedoria, reagiremos às experiências da vida a partir de nossos preconceitos, crenças e julgamentos. Com consciência e sabedoria ponderaremos sobre os meios mais hábeis e efetivos de lidar com as situações que pedem por uma ação.
Godwin Samararatne explica assim: “Há duas palavras interessantes em inglês que evidenciam a diferença: responder e reagir. Então, com a meditação, você aprende a desenvolver esta qualidade de responder a situações, agindo sem reagir. Reação é um estado emocional: quando você vê o sofrimento em outros, você não consegue lidar com isso. Mas aqui eu sugiro que você aprenda a desenvolver esta bela qualidade de responder e, assim, reagir menos. Como nós ainda somos humanos, em certas situações poderemos estar reagindo também, o que, por sua vez, pode ser uma experiência de aprendizagem – para descobrir, para perguntar: por que eu reagi nesta situação?”
Quando alguém lhe criticar dizendo que meditar é algo passivo, você pode responder que você medita para estar mais presente nas situações, para compreender mais inteiramente e, assim, poder responder de maneira mais hábil e sábia, para o bem de todos.
* Ricardo Sasaki é psicólogo clínico e um dos professores do NUMI.